Esgoto
Doméstico
O Mito do 100%: Por Que o Volume de Água
Consumida é Diferente do Volume de Esgoto Gerado, Segundo a ABNT
Muitos consumidores, ao
receberem a conta de água e esgoto, se deparam com a cobrança do serviço de
esgotamento sanitário baseada em 100% do volume de água potável consumida,
medida pelo hidrômetro.
Essa prática, embora comum em
muitas concessionárias, ignora uma realidade técnica e física crucial,
amplamente reconhecida pelas normas brasileiras:
O VOLUME DE ESGOTO GERAD É SEMPRE INFERIOR AO VOLUME
DE ÁGUA CONSUMIDA.
Neste primeiro artigo sobre a
cobrança de esgoto, vamos desmistificar essa equivalência e explicar como as
diretrizes da ABNT e a lógica da engenharia sanitária demonstram essa
diferença.
A Diferença Fundamental: Água Consumida vs.
Esgoto Lançado
O serviço de esgotamento
sanitário (coleta e tratamento) deve ser cobrado pelo volume de efluente
(esgoto) lançado na rede coletora. O volume de água medido no seu hidrômetro
inclui toda a água que entra na sua propriedade, mas nem toda essa água retorna
à rede como esgoto.
O Fator de Perda (ou Consumo)
É aqui que entra o conceito de "consumo não devolvido" ou "perda de volume". O consumo de água é dividido, basicamente, em duas categorias:
- Água Devolvida à Rede (Esgoto): Aquela
utilizada em chuveiros, pias, vasos sanitários e tanques, que é
imediatamente lançada no sistema de esgoto.
- Água Consumida (Não Devolvida):
Aquela utilizada em atividades que não resultam em efluente
lançado na rede coletora de esgoto.
O Que a ABNT Considera "Água Não Lançada
na Rede"?
Embora as normas da ABNT sobre
projeto (NBR 9649 sobre redes coletoras, ou a NBR 8160 sobre esgoto predial) não estabeleçam um
percentual fixo de cobrança, elas fornecem a base técnica para o entendimento
do fluxo de esgoto e, implicitamente, reconhecem a diferença de volumes ao
considerar o projeto do sistema.
As atividades que tipicamente
consomem água sem gerar esgoto no mesmo volume (ou local) incluem:
- Irrigação de Jardins e Gramados: A
água é absorvida pela terra e pelas plantas, sendo devolvida à atmosfera
por evapotranspiração, não entrando no sistema de esgoto.
- Lavagem de Calçadas e Pátios: Parte
considerável dessa água escoa para a drenagem pluvial (galerias de água da
chuva), e não para a rede de esgoto sanitário. É essencial que os sistemas
sejam separados, conforme a NBR.
- Enchimento de Piscinas: A
maior parte da água evaporada ou utilizada para o enchimento inicial não é
despejada na rede sanitária.
- Perdas Internas: Pequenos
vazamentos em torneiras ou válvulas que molham o jardim ou evaporam.
Se você gasta, por exemplo, 10 m³ de água, e 1 m³ é usado para regar
o jardim, o volume máximo de esgoto lançado na rede é de 9 m³. No entanto, muitas concessionárias insistem na
cobrança de esgoto sobre os 10 m³
Implicações da Sobrecarga na Cobrança
A cobrança de 100% sobre o
volume de água consumida ignora o Princípio do Usuário-Pagador de forma
injusta, pois:
- Gera Injustiça Financeira: O
usuário paga por um serviço (tratamento de esgoto) que não foi prestado
para o volume de água consumido, mas não lançado na rede.
- Incentiva a Ilegalidade: A
falta de reconhecimento do volume real de esgoto pode levar alguns
usuários a buscarem formas de desviar o fluxo da água não devolvida à rede
para não serem cobrados por ela.
Conclusão (Parte 1)
É tecnicamente indiscutível que
o volume de esgoto gerado por um imóvel é menor que o volume total de água
consumida, graças ao uso da água para fins não sanitários (irrigação,
evaporação, etc.). A base legal e técnica para contestar a cobrança integral reside
exatamente nesse princípio da Engenharia Sanitária, endossado pelas práticas de
projeto que a ABNT orienta, onde fixa o coeficiente de retorno (o
quanto do volume de água que entra na residência vira esgoto), em 80%, valor
este que é utilizado nos projetos de esgotamento sanitário.
OU SEJA, 10 M³ DE ÁGUA, IMPLICA
EM 8 M³ DE ESGOTO
No próximo artigo desta série,
exploraremos outros aspectos legais e técnicos para a COBRANÇA DIFERENCIADA e
como os consumidores podem se organizar para exigir uma cobrança mais justa e
transparente.

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