50 ANOS DE ENGENHARIA GENERALISTA
É com uma emoção indescritível
e um coração transbordando de orgulho que se registra, neste marco de
cinquentenário, a grandiosa jornada da nossa Turma de Engenharia Civil de 1975
da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).
Para nós, que vivenciamos cada passo dessa
formação, esta data não é apenas um jubileu de ouro; é a cristalização de um
legado, a celebração de uma vida dedicada e a lembrança vívida de um tempo
fundamental em que nos forjamos como engenheiros e cidadãos.
Passaram-se cinco décadas
desde que, jovens e cheios de ideais, deixamos os corredores da UFMT. Lembro-me
claramente do vibrante ambiente acadêmico, das horas de estudo, dos debates
construtivos e da sólida camaradagem que nos uniu, permeando os desafios
intelectuais e as descobertas. Naquele período, a crença na engenharia como
motor de transformação para o Brasil era uma força motriz, e essa chama, acesa
em 1975, continua a brilhar intensamente na memória e nas realizações individuais
e coletivas.
A formação que recebemos, à
época, destacava-se por sua singularidade. Éramos a personificação do "ENGENHEIRO
GENERALISTA", um conceito que, na paisagem atual de hiperespecialização,
talvez exija um olhar mais aprofundado para ser plenamente compreendido. Nossos
currículos foram meticulosamente desenhados para nos proporcionar uma
compreensão abrangente e profunda das diversas vertentes da engenharia civil.
Mergulhávamos no estudo de estruturas, visualizando as grandes edificações do
futuro; desvendávamos a complexidade dos transportes, imaginando as rodovias
que interligariam este vasto país; explorávamos os sistemas hidráulicos e de
saneamento, essenciais para a qualidade de vida; e nos aprofundávamos na
geotecnia, aprendendo a interpretar a essência do solo. A premissa não era o
domínio de uma única disciplina, mas sim o desenvolvimento de uma visão
sistêmica, uma rara capacidade de transitar entre as áreas e de conceber um
projeto em sua totalidade, desde a concepção inicial até a execução final. Como
o valioso documento que celebra este momento tão bem destaca: fomos preparados
para ter uma "visão sistêmica e a capacidade de transitar entre
elas".
Entretanto, nossa jornada
acadêmica não foi isenta de obstáculos. Recordo-me nitidamente dos desafios
colossais que enfrentávamos, em particular a escassez de literatura técnica e
de livros didáticos em português. Muitas vezes, a busca por conhecimento de
ponta nos levava a publicações estrangeiras, exigindo um esforço adicional de
tradução e adaptação. Essa limitação bibliográfica, paradoxalmente, revelou-se
uma forja. Ela nos impulsionou a adotar uma abordagem mais prática e engenhosa,
a buscar soluções "na raça", a exercitar a criatividade e a inovar
com os recursos disponíveis. Essa adversidade, longe de nos deter, fortaleceu
nossa capacidade de raciocínio independente e de aplicação dos princípios
teóricos em cenários reais, muitas vezes com recursos limitados – uma lição
valiosa que carregamos para a vida profissional. Apenas no ano de 1976, tive a
oportunidade de conhecer uma calculadora eletronica, ainda assim de posse de um Engenheiro
alemão que visitava a UFMT.
Régua
de Cálculo
Escalímetro
Triangular
Normógrafo
Essa filosofia educacional,
com sua ênfase na amplitude, não surgiu por acaso. Tinha um alicerce legal e
filosófico robusto: o Decreto Federal nº 23.569, de 11 de dezembro de 1933.
Este marco regulatório foi fundamental para unificar e padronizar as profissões
de engenheiro, arquiteto e agrimensor no Brasil, consolidando a identidade da
engenharia nacional e, de forma decisiva, moldando o perfil do engenheiro
generalista. Lembro que essa regulamentação assegurava que, ao concluirmos a
graduação, tivéssemos uma base sólida em matemática, física, química e em todas
as ramificações da engenharia civil. Essa amplitude de conhecimento nos
permitiu não nos restringirmos a nichos específicos, mas sim atuar em múltiplos
setores, contribuindo de maneira decisiva para o desenvolvimento urbano e
rural, para a infraestrutura de transportes, para o saneamento básico e para o
avanço da indústria. Fomos formados para ser o "engenheiro completo",
aptos a atuar em "múltiplos fronts e de conceber soluções inovadoras para
os desafios de um país em plena expansão".
Ao longo dessas cinco décadas,
nossas mãos e mentes estiveram intrinsecamente ligadas à projetos e construções.
Participamos ativamente da concepção e execução de obras que transformaram
paisagens e vidas: rodovias que encurtaram distâncias, pontes que uniram
comunidades, edifícios que se ergueram como símbolos de progresso e sistemas de
saneamento que promoveram saúde e bem-estar. A formação abrangente que
recebemos foi crucial. Ela nos concedeu a resiliência para nos adaptarmos às
constantes mudanças tecnológicas e aos novos desafios que surgiam, reafirmando
a perene validade de uma base de conhecimento sólida e versátil. A
adaptabilidade, que se tornou nossa ferramenta principal, e a robustez do
conhecimento fundamental, nossa rocha, resistiram ao teste do tempo.
Olhando para trás, não se veem
apenas anos de árduo trabalho, mas uma vida permeada de propósito e de
contribuição inestimável. É com grande orgulho que registramos os nomes que
compõem esta turma histórica, inscritos na placa afixada na UFMT, para a posteridade:
Alfredo Carlos Martins (†),
Antonio Evaristo de Marchi, Benedita Yvelise de Miranda, Dejair Arantes Lima (†),
Edson Laje de Souza, Gilson Oliveira dos Santos (†), Heliana Vilela de
Oliveira, Ingrid Herman, Joely Leite de Barros, Jorcy Francisco de França
Aguiar, José Anibal M. Torres, Lourival José Ferreira, Luiz Bondespacho
Nunes, Maria Leticia Matos Conceição, Osvaldo Gomes Bezerra (†), Paulo Modesto
Filho, Quidauguro M. Santos da Fonseca (†), Sinomar Alves Silveiro (†), Wilson
de Oliveira e Wilson Pinto (†).
E com igual reverência,
lembramos os que nos guiaram e inspiraram: o Professor Arthur Waldir Anffe, que
honrosamente emprestou seu nome à turma, o Patrono José Garcia Neto e o
Paraninfo Carlos Augusto Alves Corrêa.
A experiência que acumulamos
como ENGENHEIROS GENERALISTAS ao longo dessas décadas reforçou uma verdade
incontestável: a amplitude do conhecimento é uma bússola insubstituível em um
cenário que se torna cada vez mais intrincado e desafiador. Embora a
especialização seja, sem dúvida, vital, a capacidade de interligar diferentes
áreas, de cultivar uma visão holística e de se adaptar com agilidade a novas
realidades é o que nos permitiu, e continua a permitir, navegar pelas
complexidades do século XXI. É o desejo que nossa trajetória sirva de
inspiração para as futuras gerações de engenheiros, encorajando-os a buscar não
apenas a profundidade da especialização, mas também a vastidão do conhecimento
que caracteriza os verdadeiros mestres em sua arte.
Este jubileu de ouro,
portanto, transcende a mera celebração de um evento passado. É um registro
histórico vivo, um testemunho do impacto e da resiliência da Turma de
Engenharia Civil de 1975 da UFMT, muitos em memória, alguns de pijama, e outros
ainda na ativa.
É um convite à reflexão sobre
a importância de uma formação acadêmica robusta, da capacidade de superação
diante das adversidades e do legado duradouro que a engenharia oferece à
construção de uma sociedade melhor. Que este registro sirva como um tributo
perene à nossa jornada, um reconhecimento do nosso inestimável contributo, e
uma inspiração para as gerações que hão de vir.
E hoje viva a INTELIGENCIA
ARTIFICIAL, minha parceira diária nas atividades de engenharia, sinal de novos tempos.